Relata a experiência da execução do Programa de Extensão Fábrica de Cuidados como tecnologia social para construção de modelos de cuidar em saúde.
A ideia do Programa de Extensão Fábrica de Cuidados (PEFC) nasceu em 1996, quando docentes do Departamento de Enfermagem Fundamental (DEF) foram movidos pelo desejo de criar um projeto de extensão universitária para atender a demanda de articulação com duas comunidades adstritas à Escola de Enfermagem Alfredo Pinto (EEAP), em busca de cobertura de serviços inexistentes na área. As Associações de Moradores Alma e Amovila estavam preocupadas com a saúde de seus membros e acesso a atividades, como esportes, lazer e cultura.
Após inúmeras reuniões com as comunidades, construímos o Projeto Fábrica de Cuidados vinculado ao Departamento de Extensão da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), com definição de suas bases teóricas e práticas das áreas humanas, sociais e exatas para construção de modelos e tecnologias voltados à prevenção de agravos e proteção e promoção à saúde da população em tela.
Dada abrangência, fortalecimento e impacto, atualmente está instituído como PEFC, estruturado por dois eixos – Assistência de Qualidade e Administração Participativa para Gerência de Qualidade. O primeiro eixo se pauta no direito à saúde como realização plena do ser humano, através de ações facilitadoras e promotoras de acessibilidade às oficinas de cuidados, de modo que se supere as expectativas dos clientes e se alcance suas satisfações. O segundo incorpora ideais da interdisciplinaridade e da democracia como marcos de referência, com pertencimento a vários saberes e trabalho coletivo, por meio de intercomunicação e compartilhamento de ideias e ações, assegurando o discurso de ser diferente, livre, autônomo sobre si e de decidir sobre propostas lançadas.
O PEFC se distingue das demais organizações de saúde por ser um espaço social de produção, utilização, (re) significação e transformação de saberes e práticas interdisciplinares, por meio de atividades comunitárias e educativas. O perfil do cliente é de pessoas da comunidade adstrita e interna da UNIRIO, supostamente saudáveis, que necessitem de diagnósticos simplificados de saúde, intervenção com cuidados de menor complexidade para manter ou promover a saúde do corpo objetivo e subjetivo. A partir dessas práticas, se busca o desenvolvimento de novas tecnologias e soluções para os problemas que emergem da comunidade como espaço de produção e socialização do saber, local aglutinador e multiplicador de conhecimento.
Incorporamos nas ações de gerenciar e cuidar, o discurso mundial sobre a função do ambiente da saúde como uma responsabilidade de todos. Em si, isso não foi uma dificuldade, mas houve desafios instigantes para acompanhar as permanentes mudanças e cobranças ao desenvolvimento de inovações tecnológicas.
Ao enfrentá-las, transformamos o PEFC em tecnologia, por meio de saberes e modus operandi coletivos. Os pilares estruturantes como Tecnologia social são objetos/conceitos relacionados ao corpo social e individual; ambiente e cuidados em saúde. Um tripé teórico que sustenta nossas ações na perspectiva de experiências inovadoras avaliadas e valoradas por todos os envolvidos.
Nesse processo dinâmico, se cria entendimentos de cuidar de si e dos outros. Por ser docentes da área de saúde, podemos cuidar em qualquer lugar e pudemos desconstruir, mesmo que lentamente, a ideia das comunidades que só pensavam na saúde quando adoeciam. Nas reuniões, moradores e funcionários afirmavam que se sentiam confortáveis em saber que a Fábrica era um “porto seguro” para correr, porque as “professoras estariam sempre ali quando precisassem ou passassem mal”. Torna-se um lugar de proteção dos riscos impostos pelo ambiente social.
Essas declarações dispararam a necessidade de revisão de nossas ações, avaliação das formas de abordagens e inclusão de novas atividades. Assim, após muitas discussões conjuntas, vimos ser imprescindível fortalecer os princípios e as diretrizes do Sistema Único de Saúde, sensibilizando os estudantes sobre a ideia de responsabilidade de atender as demandas e necessidades, de modo a encaminhar nossos clientes para outras unidades de saúde quando não mais fosse possível cuidar deles com autonomia e segurança.
Objetiva-se relatar a experiência da implementação do Programa de Extensão Fábrica de Cuidados como tecnologia social para construção de modelos de cuidar em saúde.