Os enfermeiros podem ser profissionais fundamentais nas escolas de ensino fundamental e médio, já que têm capacidades de atuar na prevenção e promoção da saúde.
A capacidade de resposta dos sistemas de saúde passa pelo enfrentamento de diversos desafios, tais como as mudanças socioeconômicas e políticas, as mudanças no perfil epidemiológico, os surtos de doenças e as mudanças climáticas. Nesse sentido, as políticas de saúde que se voltem para o atendimento de necessidades e problemas de saúde e para o alcance do acesso universal à saúde e da cobertura universal da saúde requerem uma nova e mais abrangente abordagem das funções essenciais da saúde pública.
As funções essenciais da saúde pública compreendem ações de vigilância, controle e gestão de riscos, gestão do conhecimento, desenvolvimento de políticas, participação e mobilização social, recursos humanos, alocação de medicamentos e outras tecnologias de saúde, financiamento da saúde, e, por fim, acesso a serviços abrangentes e de qualidade, com abordagem voltada para os determinantes sociais.
Os recursos humanos para a saúde têm papel fundamental nos sistemas e serviços de saúde. É esperado que os serviços contenham profissionais capacitados para o modelo assistencial, com competências adequadas e distribuídos de forma a atender às necessidades da população. Entretanto, limitações nos investimentos e as desigualdades no acesso, disponibilidade, distribuição e qualidade da força de trabalho em saúde são a realidade atual.
A Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS/OMS) tem, desde 2013, promovido discussões para fomentar a educação, a regulação e a implementação de Enfermeiros de Prática Avançada (EPA) como uma estratégia para aumentar o acesso da população a um profissional da enfermagem mais capacitado e autônomo. A OPAS/OMS considera a EPA uma profissional com formação de pós-graduada que, integrada à equipe interprofissional dos serviços de Atenção Primária à Saúde, contribui para a gestão dos cuidados de pacientes/usuários com enfermidades agudas leves e transtornos crônicos, diagnosticados segundo as diretrizes de protocolos ou guias clínicos. O exercício profissional é ampliado e diferenciado daquele que desempenha a enfermeira da atenção primária em função do grau de autonomia na tomada de decisões e no diagnóstico e tratamento das necessidades do paciente.
A base da atuação está na educação formal do enfermeiro, em programas de mestrado profissional, com conhecimentos especializados, habilidades complexas e competências clínicas ampliadas para a prática de enfermagem. A autonomia na tomada de decisões e a possibilidade de prescrever medicamentos é um diferencial, quando comparado ao enfermeiro generalista.
No atual contexto da pandemia do SARS-CoV-2, o sistema de saúde tem sido fortemente afetado, assim como os setores produtivos, da economia e da educação, ressaltando os desafios no enfretamento da pobreza, da desigualdade e dos sistemas de proteção social.
A pandemia destacou as lacunas dos sistemas de saúde, principalmente a falta de investimentos, o déficit de profissionais e as condições de trabalho nem sempre adequadas. Vulnerabilidades foram acentuadas em determinados grupos populacionais, tais como a população que vive em assentamentos ou em áreas rurais remotas, indígenas, população privada de liberdade, trabalhadores informais ou de serviços essenciais de baixa renda, migrantes, mulheres, crianças e adolescentes vivendo em situação de violência, pessoas em condição de rua, pessoas com deficiência e idosos.
A educação é um setor que tem sido gravemente afetado. Estima-se que, desde março de 2020, mais de 1,5 bilhões de estudantes, a nível mundial, enfrentaram interrupções significativas decorrentes do fechamento de escolas e universidades.
O ensino remoto foi a opção encontrada e a educação se transformou de presencial para virtual, em semanas e meses. Embora o ensino remoto busque reduzir o déficit de aprendizagem, tem como consequências a perda de habilidades cognitivas e sociais e a exclusão digital, afetando os jovens e suas famílias.
As medidas de confinamento reduziram a possibilidade de realização de atividades físicas e utilização de instalações recreativas, alteraram o acesso a alimentos e o padrão alimentar e aumentaram o consumo de álcool, tabaco e drogas. Somam-se a esses fatores o risco psicossocial com a tensão e o estresse.
Crianças e jovens estão sendo afetados, o que requer mudanças no sistema educacional, com programas que apoiem o desenvolvimento de habilidades cognitivas, comportamentais, direitos sexuais e reprodutivos, nutrição e saúde mental. A saúde e a educação são conceitos bidirecionais: a educação de boa qualidade é um investimento para a saúde e a saúde é essencial para uma aprendizagem eficaz. Nessa lógica, as escolas promotoras de saúde são um importante mecanismo para ampliar a relação entre saúde e educação e valorizar alunos, professores e famílias, em alinhamento com Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
Nesse contexto, os enfermeiros podem ser profissionais fundamentais nas escolas de ensino fundamental e médio, já que têm capacidades de atuar na prevenção e promoção da saúde, no cuidado e no tratamento de doenças. A atual situação das escolas e a pandemia de SARS-CoV-2 são uma oportunidade para a atuação de EPA.
Esse profissional, em diversos países, tem forte atuação nos serviços de saúde escolar. Nos Estados Unidos, por exemplo, há mais de 20 anos, esses profissionais atuam no atendimento de condições crônicas e agudas, na saúde mental, na vacinação, na coordenação do cuidado, no acompanhamento de crianças e adolescentes junto à família, no acesso aos serviços de saúde, na educação e promoção de saúde e na preparação para o enfrentamento de situações de emergência.
O EPA atuante nas escolas aplicará suas decisões baseadas em evidências, buscará parcerias e apoiará a atuação de epidemiologistas, infectologistas e outros profissionais, além de ações de promoção da saúde, prevenção de doenças e orientação sobre os cuidados na prevenção do SARS-CoV-2, tais como uso de máscaras, a importância e a lavagem correta das mãos, medidas para evitar o contágio e disseminação da doença, importância da vacinação de escolares e família, medidas de detecção e isolamento dos casos, exames e diagnóstico da doença e outras ações dirigidas tanto aos alunos e seus familiares quanto à própria comunidade da escola.
A implementação de parcerias e os esforços colaborativos entre os setores de saúde e educação demonstram importante potencial para enfrentamento da pandemia, de forma que os enfermeiros de prática avançada, com formação em saúde do escolar e/ou saúde pública, podem, além das ações apresentadas, auxiliar na reabertura das escolas e na segurança de todos: alunos, professores, funcionários e familiares.
É sabido que os enfermeiros estão nos serviços de saúde na linha de frente desta pandemia, entretanto podem atuar em outros dispositivos caso tenham oportunidades. Ampliar sua atuação, nos serviços de saúde e outros espaços, pode melhorar os resultados de saúde da população em geral.
Investir na formação e implementação do EPA impactará no setor econômico, na reabertura segura das escolas, na educação das futuras gerações e na promoção da saúde, com consequente redução de taxas de doenças e dos custos na saúde. Entretanto, é fundamental e urgente a mobilização e a atuação da sociedade civil, das escolas, dos profissionais e de suas sociedades e órgãos reguladores junto aos tomadores de decisão.