Relata os 10 anos da ferramenta de cooperação técnica desenvolvida pela OPAS/OMS no Brasil, por meio dos Laboratórios de Inovação em Saúde.
Em 2008, a representação da OPAS/OMS no Brasil idealizou e apresentou às contrapartes nacionais, inicialmente ao Ministério da Saúde do Brasil, uma ferramenta de cooperação técnica centrada na gestão do conhecimento denominada de Laboratório de Inovação em Saúde (LIS) que visa auxiliar na identificação, sistematização e compartilhamento de experiências inovadoras e boas práticas que respondam aos desafios postos ao setor saúde e que possam ser replicáveis em contextos sanitários similares. O LIS tem a finalidade de transformar o conhecimento tácito, fruto da vivência e da expertise dos trabalhadores e profissionais da saúde, em explícito, com vistas a potencializá-lo através da visibilidade de experiências inovadoras e exitosas perante gestores, trabalhadores, pesquisadores, políticos, representantes da sociedade civil e outros atores envolvidos no tema.
Para ser considerada inovadora, a experiência deve destacar o valor social desempenhado pela prática, não basta ser nova ou somente uma sofisticação tecnológica, mas ressaltar os resultados positivos que ela produz para os indivíduos e coletividade no âmbito do sistema público de saúde. Considerada como função fundamental do gestor, a inovação em saúde deve introduzir mudanças que possibilitem resultados concretos e mensuráveis, podendo envolver diferentes áreas, como desempenho, qualidade, eficiência e satisfação dos usuários.
Para implementação de um LIS, flexibilidade e adaptabilidade são fundamentais. Isso significa que a metodologia deve ser fluida e adaptável aos diferentes contextos e participantes de um laboratório. Assim, na maioria das vezes não é possível definir todas metodologias que serão aplicadas em um LIS antes de conhecer as experiências que farão parte dele. Ainda assim, pode-se destacar alguns conceitos e metodologias base que, quando aplicadas em conjunto, conformam o laboratório.
Considera-se o conceito de Espiral de Conhecimento (Modelo SECI), que descreve quatro modos de conversão do conhecimento tácito em explícito, sendo eles: Internalização; Socialização; Externalização; e Combinação. A conversão do conhecimento ocorre através da prática cotidiana (internalização), da troca de experiências entre pares (socialização), da exposição e divulgação do conhecimento adquirido (externalização) e finalmente da aplicação desse conhecimento, agora explícito (combinação). A espiral sugere que seus aspectos devem estar plenamente envolvidos para ampliar o conhecimento, pois as aprendizagens explícita e tácita são codependentes. Uma vez que os conhecimentos são totalmente gerados pelos atores do processo, ou seja, as experiências e os participantes do LI, o papel dos promotores do LIS é a criação e estruturação de um espaço de troca de informações e intercâmbio de experiências, fornecendo ferramentas de interação e divulgação do conhecimento.
O intercâmbio de conhecimento por meio de experiências pode oferecer aos gestores do SUS elementos relevantes para melhorar processos e resultados em saúde, além de ser fonte de inspiração para a introdução de mudanças e inovações. As atividades do LIS preveem encontros presenciais, virtuais, visitas de intercâmbio, produções de publicações técnicas (NavegadorSUS e Inovação na Gestão) e informativos no site criado para divulgar as práticas inovadoras, o Portal da Inovação na Gestão do SUS (www.apsredes.org) e em sites institucionais parceiros. Os objetivos são apoiar os tomadores de decisão no desenho de políticas de saúde adequadas às necessidades de seus territórios e manter motivada a comunidade de prática dos profissionais da saúde comprometidos numa determinada temática, mediante a divulgação dos processos de inovação dos gestores para resolver problemas recorrentes do SUS.
O LIS trabalha com duas tipologias: a mais usual é de caráter empírico baseada na análise ex-post de casos inovadores, focados na identificação de experiências que desenvolveram práticas e soluções inovadoras, com resultados que demonstram mudanças e melhorias concretas em determinados aspectos, como logístico, de monitoramento, processos de trabalho, entre outros. Esse processo é fundamental para produzir conhecimentos e carregam a mensagem de que é possível introduzir mudanças efetivas e sustentáveis, de maneira ascendente, mesmo em contextos difíceis e com escassos recursos. A segunda tipologia envolve o acompanhamento de uma experiência inovadora nas suas etapas de desenvolvimento e implementação, geralmente projetos pilotos focados na introdução de novas práticas nos serviços de saúde. Os resultados são analisados por meio de estudos de caso, baseados em metodologias rigorosas, realizados por instituições acadêmicas. Por ter maior complexidade operacional, esse método foi aplicado apenas no LIS sobre o Manejo das Condições Crônicas nas Redes de Atenção (LIACC) desenvolvido em parceria com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), em duas edições. Este Laboratório teve uma relevância especial desde a perspectiva da cooperação técnica, sendo que os seus resultados induziram o CONASS a expandir esta metodologia por meio do Projeto de Planificação da Atenção à Saúde.
O estudo de caso é a principal metodologia utilizada nos LIS para sistematizar as experiências participantes, não se limitando à descrição da prática inovadora, mas se debruçando na análise do contexto socioeconômico em que a prática foi desenvolvida. A visita de pesquisadores integrantes do LIS e as entrevistas individuais ou em grupos focais realizadas no território de origem da experiência possibilitam a recuperação de informações e vivências, assim como a valorização da equipe e dos gestores envolvidos, repercutindo muitas vezes na mídia local.
Em alguns LIS, a seleção dos casos a serem analisados foi realizada diretamente pelas instituições do SUS envolvidas, porém em muitas oportunidades optou-se por realizar chamados públicos de convocação de inscrição. Um grupo de técnicos da instituição envolvida, da OPAS/OMS Brasil e de especialistas contratados ad hoc analisa os relatos enviados pelos participantes e seleciona as experiências que serão objeto do estudo de caso. Este grupo acompanha todas as fases de seleção, análise documental e visitas in loco, até a divulgação final com a sistematização da experiência, publicada nas séries técnicas editadas pela OPAS/OMS no Brasil e parceiros.
Ambas as tipologias do LIS visam a sistematização e a divulgação de um conhecimento específico aspirando a sensibilização de gestores e equipes, especialmente, a nível local, contribuindo com a sustentabilidade do sistema público, na possível replicabilidade das práticas em contextos similares e na valorização dos profissionais de saúde envolvidos, em sua maioria, servidores públicos.