Compreende as questões bioéticas envolvidas na gestão do cuidado dos enfermeiros que atuam na Estratégia Saúde da Família.
Um dos pressupostos da Estratégia de Saúde da Família (ESF) é a atenção à saúde centrada na família, inserida no contexto físico, social e cultural. Isso requer dos profissionais compreensão ampliada do processo saúde-doença, sendo cenário privilegiado para prática da clínica ampliada, do cuidado continuado, capaz de potencializar ações que impulsionam mudanças voltadas à construção da integralidade.
Ao utilizar tecnologias de cuidado majoritariamente leve e leve-duras para as demandas complexas e variadas, no manejo das necessidades de saúde no território de abrangência, a ESF considera critérios de risco, vulnerabilidade, resiliência, com imperativo ético de que toda necessidade de saúde ou sofrimento devam ser acolhidos. O modelo de cuidado individual e familiar busca promover o cuidado da população com base no princípio da integralidade.
Segundo Cecílio, a gestão do cuidado em saúde caracteriza-se pela utilização de tecnologias que visam promover coordenação do cuidado, segurança e autonomia do usuário, considerando suas necessidades singulares, com base em seis dimensões interdependentes: individual; familiar; profissional; organizacional; sistêmica; e societária. Neste estudo, foram exploradas as dimensões “organizacional” e “profissional” com enfoque nas questões éticas da prática do cuidado dos enfermeiros que atuam na ESF.
A literatura aponta a existência de relevantes problemas bioéticos, que emergem da prática de cuidado no contexto da Atenção Primária à Saúde, especificamente na ESF, e, de acordo com Zoboli e Fortes, entendidos sob três perspectivas primordiais: problemas éticos nas relações com usuários e família; nas relações da equipe; e nas relações com a organização e com o sistema de saúde.
Revisão integrativa corroborou essas três perspectivas de problemas éticos e destacou que, na prática dos enfermeiros, os problemas éticos referem-se às dificuldades na comunicação, autonomia e respeito na relação com os usuários, situações da relação entre os profissionais e formação acadêmica, desafio em delimitar responsabilidades e especificidades de cada profissional, despreparo para trabalhar em equipe, dificuldades em preservar a privacidade dos usuários por deficiências estruturais das unidades de saúde e excesso de famílias adscritas para cada equipe, que implica sobrecarga de trabalho e pouco tempo para o cuidado aos usuários. Tais situações desafiam os profissionais, até mesmo pelas dificuldades prático-teóricas, na proposição de soluções éticas vivenciadas.
Estudo canadense reafirma a complexidade de abordar questões bioéticas na prática clínica dos enfermeiros, destacando a necessidade de aprimoramento da habilidade de tomada de decisão ética como ferramenta para a prática profissional. Além disso, ainda há uma dificuldade representada pela escassez de publicações sobre ética e bioética na Atenção Primária, em comparação com estudos dentro do cenário hospitalar.
Assim, identificar as questões bioéticas envolvidas na gestão do cuidado organizacional e profissional dos enfermeiros atuantes na ESF, bem como os aspectos influenciadores do processo de trabalho para o enfrentamento dessas situações, permitirá compreender esse fenômeno e refletir sobre as melhores práticas de formação em serviço para a sua condução. Dessa forma, pergunta-se: “Quais são as questões bioéticas na gestão do cuidado dos enfermeiros atuantes na Estratégia Saúde da Família sob a perspectiva desses profissionais e quais aspectos os influenciam na condução de tais questões?”