Pesquisa com Agentes Comunitários de Saúde Durante a Covid-19 Apresenta Primeiro Balanço

17 de agosto de 2020 por filipesoaresImprimir Imprimir

Analisa os impactos da Covid-19 nos trabalhadores da saúde, bem como as condições de trabalho ofertadas a eles no momento da pandemia em capitais do país que apresentam elevados números de casos.


Foi lançado nesta semana o primeiro boletim bimensal da pesquisa de ‘Monitoramento da saúde e contribuições aos processos de trabalho e a formação profissional dos agentes comunitários de saúde (ACS) em tempos de Covid-19’. A pesquisa, coordenada pelas pesquisadoras da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) Mariana Nogueira e Camila Borges, tem a participação de outros pesquisadores do Poli e de outras unidades da Fiocruz.

Pesquisa com Agentes Comunitários de Saúde Durante a Covid-19 Apresenta Primeiro Balanço

Pesquisa com Agentes Comunitários de Saúde Durante a Covid-19 Apresenta Primeiro Balanço.

Leia a íntegra da publicação, disponível no Observatório Covid-19: Informação para ação e na página da EPSJV/Fiocruz.

Segundo Mariana, a pesquisa tem como objetivo principal analisar os impactos da doença na saúde desses trabalhadores, bem como as condições de trabalho ofertadas a eles no momento da pandemia em capitais do país que apresentam elevados números de casos, além de outras três cidades das regiões metropolitanas dessas capitais. De acordo com o boletim, embora tenha havido redução das visitas domiciliares, 83% dos participantes relatou a manutenção dessa atividade, o que, associado ao fornecimento deficitário e inapropriado de EPI, ajuda a compreender a insegurança manifesta por percentual tão elevado de ACS.“Contamos com a participação de 1978 ACS, sendo 734 participantes de São Paulo, 116 de Guarulhos; 588 do Rio de Janeiro, 153 de São Gonçalo; 291 em Fortaleza e 96 em Maracanaú”, aponta.

Covid-19: boletim

O boletim, referente aos meses de abril e maio, está organizado em seis partes – o perfil dos participantes, dados em relação ao acesso de equipamentos de proteção individual (EPI), ao processo de trabalho, às condições de saúde das agentes comunitárias, às vivências de perda e sofrimento psíquico e emocional e à precariedade na formação para atuação na pandemia. Nesta fase, 92,4% das participantes foram mulheres, em uma faixa predominante de idade entre 30 e 39 anos. Entre as respondentes, 52,5% declararam-se pardas e 18,8% pretas. “Os dados compõem um conjunto de elementos que constituem a vida das mulheres trabalhadoras, que inclusive, no momento de pandemia, além de lidarem com o aprofundamento da desigualdade social, seguem se defrontando com a sobrecarga de trabalho, com as expressões do machismo e com as demais consequências do patriarcado, que impõem, historicamente, às mulheres trabalhadoras as tarefas do cuidado”, ressalta Mariana.

Dos resultados mais alarmantes, Mariana destaca que 47,1% dos ACS referiu apresentar algum problema ou questão de saúde que indica maior risco no caso de adoecimento por Covid-19, principalmente hipertensão arterial.

Equipamentos de proteção

Em relação aos equipamentos de proteção, os municípios que os ACS atuam e moram apresentam uma alta porcentagem de trabalhadores que informou o não fornecimento de EPI aos profissionais de saúde pelas unidades básicas. Em Maracanaú, por exemplo, 52,1% dos participantes informou sobre a ausência dessa distribuição. Dentre os ACS que receberam máscaras cirúrgicas, 39,3% afirmou não receber esse equipamento em quantidade suficiente e 45,3% disse que a qualidade é insuficiente. Além disso, cerca de 10% dos ACS disse não dispor de água e sabão nas unidades de saúde para lavagem das mãos sempre que necessário.

Ao todo, 95,6% dos trabalhadores afirmou ter apresentado algum sinal e sintoma associado à Covid-19 nos meses de abril e maio. Entre estes, 39,9% perderam olfato ou paladar, 31% teve febre, e 30% teve dificuldade de respirar. “Nesse contexto, é muito expressiva a quantidade de ACS que não tiveram acesso a testagem (53,8%). A testagem deveria ser priorizada para os profissionais de saúde, a falha na provisão de testes prejudica as ações de vigilância em saúde e a oferta de cuidado. A não-testagem implica numa maior exposição desses trabalhadores e da população atendida”, pontua Mariana.

Saúde mental

A pesquisa também traz dados importantes sobre a vivência de perdas e o sofrimento emocional durante a pandemia. 45,2% do total de ACS vivenciaram a morte de usuários que acompanhavam ou de outras pessoas por Covid-19 com quem mantinham vínculos pessoais e 96,1% relatou sofrimento relacionado ao contexto da pandemia. “Os sinais frequentes mais indicados foram insônia, tristeza e angustia”, afirma Mariana. Isso porque o cenário era de total incerteza, já que 46,9% informou que as unidades básicas de saúde e as secretarias municipais de saúde não proporcionaram formação ou treinamento para que pudessem atuar neste momento de pandemia e 32,6% dos ACS indicou ter havido formação ou treinamento insuficiente.

“É importante considerar que não é garantido ao ACS. Enquanto política pública nacional, a segurança no trabalho, o acesso aos equipamentos de segurança, o acolhimento em relação ao sofrimento emocional… Também não é garantido a universalização da formação técnica específica, o que torna mais relevante a produção de pesquisas que contribuam para dar visibilidade a essa precariedade, além da contribuição da necessidade que o SUS efetive a sua atribuição de orientar e promover processos formativos, assim como promover condições seguras de trabalho”, conclui Mariana.

A pesquisa

Mariana antecipa que esse mês a equipe irá aplicar novamente a pesquisa para levantar as informações referentes aos meses de junho e julho. Todos os dados do estudo serão disponibilizados em um painel digital que deverá ficar pronto até o fim de agosto.

“Esperamos que o boletim seja um instrumento para ajudar nas demandas dos ACS organizados e também para vontade de ação dos gestores interessados”, completou Camila.

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