Fim do Preconceito é Fundamental Para Prevenção do Suicídio

10 de setembro de 2020 por filipesoaresImprimir Imprimir

Setembro Amarelo alerta para doenças como ansiedade e depressão.


O fim do preconceito com doenças mentais, como ansiedade e depressão, é fundamental para a prevenção ao suicídio. A afirmação é da coordenadora-geral de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Dilma Alves Teodoro, e também um dos alertas da campanha Setembro Amarelo, que acontece este mês para conscientização e prevenção ao suicídio.

Fim do Preconceito é Fundamental Para Prevenção do Suicídio

Fim do Preconceito é Fundamental Para Prevenção do Suicídio.

“O preconceito faz as pessoas não buscarem ajuda. Muitas vezes elas escondem a doença porque o amigo ou familiar vai interpretá-las como uma pessoa que é fraca, que deveria reagir, quando, na verdade, ela está adoecida”, disse, em entrevista à Agência Brasil.

Segundo Dilma, ao diminuir o preconceito com essas doenças e o tabu sobre o assunto, pessoas que estão passando por algum sofrimento se sentirão mais à vontade para procurar ajuda profissional e ter um diagnóstico adequado, prevenindo possíveis tentativas de suicídio. Seja por razões religiosas, morais ou culturais, ainda há medo e vergonha em falar abertamente sobre o tema, que é um problema de saúde pública.

Setembro amarelo

Por isso, desde 2014, a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM), organiza a campanha Setembro Amarelo, que marca também o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, lembrado hoje (10). Cerca de 12 mil suicídios são registrados no Brasil todos os anos e mais de 1 milhão no mundo. De acordo com a ABP, cerca de 96,8% dos casos estavam relacionados a transtornos mentais. Em primeiro lugar está a depressão, seguida do transtorno bipolar e abuso de substâncias.

A diretora do Instituo Bia Dote, Lucinaura Diógenes, de Fortaleza (CE), sentiu na pele esse preconceito com a morte de sua filha Beatriz, por suicídio, em 2008. “Há respostas que o suicídio não traz. Foi muito impactante e mais impactante foi o que veio pós-suicídio. Depois, veio a questão do julgamento, os preconceitos, das pessoas tratarem o suicídio como falta de Deus, e a família começar a se culpar. E nesse processo todo, percebemos que outras pessoas no nosso entorno tinham passado por situação de suicídio e ninguém sabia porque elas silenciavam”, disse.

Após a criação do instituto, Lucinaura concluiu a graduação em psicologia e, com a equipe do Bia Dote, desenvolve projetos com diversos públicos, todos gratuitos, como atendimento psicoterápico, palestras em escolas, escuta especializada, intervenções urbanas e apoio e orientação para famílias enlutadas e de pessoas que fizeram tentativa de suicídio. O objetivo é sempre apontar os fatores de risco do suicídio, de proteção à saúde mental e sensibilizar as pessoas para minimizar os estigmas sobre esses temas, de forma adequada e respeitosa.

“Quando você tem um problema e não fala é como se ele não existisse. Então, trazer luz a esse problema pode te mostrar como é que ele pode ser minimizado. O homem, por natureza, não é suicida, o normal dos ser humano é que ele se proteja. O que faz ele ter a ideação suicida é exatamente por estar em uma situação em que o sofrimento transborda e ele não encontra recursos para sair dessa situação. E, às vezes, com o outro, com ajuda especializada, ele consegue encontrar esses recursos”, explicou Lucinaura.

O Instituto Bia Dote foi criado em 2013 como uma forma de ressignificar a morte de Beatriz e, segundo Lucinaura, para ajudar outras pessoas e outras famílias com prevenção e posvenção ao suicídio e na atenção à saúde mental. “A partir do que tinha acontecido, poderíamos dar uma resposta à sociedade e mudar alguma coisa. Não tem porquê silenciar a morte de Bia, porque para silenciar a morte teria que silenciar a vida, e foi uma vida muito boa, uma vida que merecia ser lembrada.”

Sinais de alerta

A coordenadora do Ministério da Saúde explica que o suicídio pode ser prevenido e que há sinais que a famílias, os amigos e professores podem perceber, como o isolamento, desinteresse pelas atividades que gostava, irritabilidade, falta de autocuidado, músicas e publicações mais tristes nas redes sociais e discursos que “a vida está mais difícil”. “São sinais que devem ser observados pela família, porque esse momento é de intervir, de chegar perto e conversar sobre o assunto, orientar para que a pessoa busque uma ajuda e se oferecer para acompanhar”, disse Dilma.

Para Lucinaura, esse tipo de informação é essencial para prevenção e acrescenta que a abertura ao diálogo deve ser feita sem julgamentos. “A partir da morte de Bia é que tivemos contato com o fenômeno suicídio. Não era um tema próximo, não era previsto essa questão de dar sinais, não sabíamos que existiam esses sinais. E, hoje, não percebo que Bia tivesse dado sinais tão evidentes. Se eu tivesse essa informação na época, talvez tivesse percebido”, destacou.

Dilma explica que o fator de maior risco para o suicídio é um transtorno mental, mas que há agravantes. Segundo ela, os dados sobre mortes por suicídio vem se mantendo estáveis ao longo dos últimos anos, com maior incidência na população jovem, de 15 a 29 anos, e nos idosos.

No caso dos jovens, ela explica que o risco pode ser potencializado pelo uso de álcool e drogas, e nos mais idosos por questões como perdas de familiares, doenças crônicas e maior responsabilidade no provimento da família. O estresse causado pela pandemia de covid-19 também pode ser fator de risco para pessoas que já têm algum transtorno ou funcionar como gatilho para o aparecimento.

“Se considerar o momento que estamos vivendo, não só a saúde pública, mas questões econômicas e sociais também tem um peso significativo. Os dados mostram que países em situações de crise grave, de calamidade, tem um risco aumentado de tentativas de suicídio”, disse.

Por isso, durante esse período, o Instituto Bia Dote abriu um canal de plantão psicológico. A diretora Lucinaura conta que a equipe fez diversos atendimentos de urgência de pessoas em situação de crise, de ansiedade, depressão e pânico, inclusive algumas com ideação suicida.

Atualmente, o canal está funcionando de terça a quinta-feira, por ligação ou WhatsApp, no número (85) 99842-0403.

Onde buscar ajuda

O Ministério da Saúde também entende o suicídio como uma emergência médica, que precisa de uma intervenção imediata. Por isso, a orientação é que se busque o serviço de urgência e emergência para um primeiro atendimento e encaminhamento para profissional especializado. Há, inclusive, inciativas em alguns estados onde o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência – 192 (Samu) possui equipes de saúde mental, como no Distrito Federal.

A rede pública possui ainda os Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e serviços de ambulatório, em unidades básicas de saúde, que funcionam com equipes multidisciplinares para atender a população.

Na internet, é possível localizar em sites especializados com informações sobre prevenção ao suicídio. Além do site da campanha Setembro Amarelo, o Ministério da Saúde também possui cartilhas e orientações sobre os sinais de alerta e como buscar ajuda.

O Centro de Valorização da Vida (CVV) também realiza apoio emocional e de prevenção do suicídio, e atende todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo, por telefone, chat e-mail, 24 horas por dia, todos os dias da semana. A ligação para o CVV, por meio do número 188, é gratuita a partir de qualquer telefone fixo ou celular.

O Instituto Vita Alere de Prevenção e Posvenção do Suicídio, com apoio do Google, lançou este ano o Mapa da Saúde Mental que traz um guia de ajuda e lista os serviços públicos disponíveis em todo território nacional, além de serviços de acolhimento e atendimento gratuitos ou voluntários realizados por organizações não-governamentais, instituições filantrópicas, clínicas escola, entre outros.

Para Lucinaura Diógenes, a questão do suicídio precisa ser tratada de forma mais ampla por outros setores da sociedade e outras ciências além da saúde, como sociais, econômicas e teológicas. “Precisamos mudar o olhar sobre essa questão para que possa reverberar em uma mudança de paradigmas. Cada pessoa precisa assumir esse papel de agente de transformação, porque não é um papel só da ciência, só das pessoas que trabalham com a saúde mental, é um papel da sociedade”, disse.

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