Sobre a elaboração, a metodologia e as recomendações das Diretrizes Nacionais de Assistência ao Parto, no sentido de dar transparência e acesso rápido e fácil para toda a sociedade sobre o resultado desse trabalho.
A cada ano acontecem no Brasil cerca de 3 milhões de nascimentos, envolvendo quase 6 milhões de pessoas, ou seja, as parturientes e os seus filhos ou filhas, com cerca de 98% deles acontecendo em estabelecimentos hospitalares, sejam públicos ou privados. Isso significa que, a cada ano, o nascimento influencia parcela significativa da população brasileira, considerando as famílias e o seu meio social.
Consolidado em nosso meio, o nascimento no ambiente hospitalar se caracteriza pela adoção de várias tecnologias e procedimentos com o objetivo de torná-lo mais seguro para a mulher e seu filho ou filha. De fato, os avanços da obstetrícia contribuíram com a melhoria dos indicadores de morbidade e mortalidade materna e perinatais em todo o mundo. Entretanto, as mulheres e recém-nascidos são expostos a altas taxas de intervenções, como a episiotomia, o uso de ocitocina, a cesariana, aspiração naso-faringeana, entre outras. Tais intervenções, que deveriam ser utilizadas de forma parcimoniosa, apenas em situações de necessidade, são muito comuns, atingindo um grande número de mulheres e seus filhos ou filhas que são assistidas em hospitais no país. Esse excesso de intervenções deixou de considerar os aspectos emocionais, humanos e culturais envolvidos no processo, esquecendo que a assistência ao nascimento se reveste de um caráter particular que vai além do processo de adoecer e morrer. Quando as mulheres procuram ajuda, além da preocupação sobre a sua saúde e a do seu filho ou filha, estão também em busca de uma compreensão mais ampla e abrangente da sua situação, pois para elas e suas famílias o momento da gravidez e do parto, em particular, é único na vida e carregado de fortes emoções. A experiência vivida por eles neste momento pode deixar marcas indeléveis, positivas ou negativas, para o resto das suas vidas.
Como resultado de pressões da opinião pública e consumidores de serviços de saúde, principalmente nos países mais desenvolvidos, assim como o surgimento de novas evidências científicas, a prática obstétrica tem sofrido mudanças significativas nos últimos 20-30 anos, com uma maior ênfase na promoção e resgate das características naturais e fisiológicas do parto e nascimento. Com isso, vários procedimentos hospitalares têm sido questionados pela carência de evidências científicas que os suportem, a existência de evidências que os contra-indiquem e por trazerem desconforto à mulher. Também os ambientes onde o nascimento tem lugar têm sofrido modificações, tornando-se mais aconchegantes e com rotinas mais flexíveis, permitindo que a mulher e sua família possam participar e expressar livremente suas expectativas e preferências. Surgem também, como opção, modalidades de assistência em ambientes não hospitalares, como o parto domiciliar e em centros de nascimento dentro ou fora dos hospitais. Questiona-se também o predomínio do profissional médico na assistência, com o fortalecimento das enfermeiras obstétricas e obstetrizes como atores importantes no processo assistencial.
Além do mais, há uma grande diversidade de práticas clínicas nos diversos ambientes de atenção e, frequentemente, também ocorre uma grande variedade de condutas aplicáveis a situações semelhantes. Esta variedade de práticas pode colocar em risco a segurança das parturientes e seus filhos ou filhas já que, em muitos casos, não devem estar recebendo a assistência mais adequada às suas necessidades e de acordo com as melhores evidências derivadas de estudos científicos bem desenhados. Em outros casos também, podem estar sendo submetidas a práticas diagnósticas ou terapêuticas com potencial de provocar danos. Adicionalmente, a enorme expansão do conhecimento científico publicado nos últimos anos dificulta a sua aquisição de forma rápida e eficiente por parte daqueles envolvidos na assistência. Muitos problemas podem ter a sua origem na aplicação inadequada do conhecimento ou mesmo a não aplicação da prática mais eficaz para lidar com situações específicas
As diretrizes clínicas baseadas em evidências fornecem uma ferramenta adequada de consulta para os profissionais na sua atividade diária já que, se corretamente desenvolvidas, com avaliação sistemática e sintetização da informação científica disponível, são potentes aliadas na tomada de decisões. Nesse processo, as habilidades e experiência clínica do provedor de cuidados associadas às expectativas e necessidades únicas das mulheres e suas famílias, mais a informação derivada da melhor pesquisa científica, formam o tripé que se chama de prática clínica baseada em evidência, uma das regras básicas para uma assistência focada na qualidade.
Em junho de 2011 o Governo Brasileiro instituiu a Rede Cegonha no âmbito do SUS (Sistema Único de Saúde), visando a assegurar à mulher o direito ao planejamento reprodutivo e à atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério, bem como à criança o direito ao nascimento seguro e ao crescimento e ao desenvolvimento saudáveis. Entre os objetivos da Rede Cegonha está o de “fomentar a implementação de novo modelo de atenção à saúde da mulher e à saúde da criança com foco na atenção ao parto, ao nascimento, ao crescimento e ao desenvolvimento da criança de zero aos vinte e quatro meses”. No componente Parto e Nascimento da Rede Cegonha figura como ação a adoção de práticas de atenção à saúde baseada em evidências científicas nos termos do documento da Organização Mundial da Saúde, de 1996: “Boas práticas de atenção ao parto e ao nascimento”. Seguindo essas determinações, o Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de Atenção à Saúde, da Secretaria de Ciência Tecnologia e Insumos Estratégicos e seus respectivos Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas e Departamento de Gestão e Incorporação de Tecnologias em Saúde (DGITS), solicitou à Coordenação-Geral da Saúde da Mulher (CGSM) e à Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC) a elaboração de diretrizes para a assistência ao parto normal, para utilização no SUS e Saúde Suplementar no Brasil.
A proposta desse documento é reunir informações resumidas sobre a elaboração, a metodologia e as recomendações das Diretrizes Nacionais de Assistência ao Parto, no sentido de dar transparência e acesso rápido e fácil para toda a sociedade sobre o resultado desse trabalho. O documento na íntegra, com toda a descrição das evidências que respaldaram as recomendações, bem como as adaptações que foram feitas está disponível em <http://conitec.gov.br>.